Reportagens

O mais baixo desmatamento da história

O governo federal anunciou que o total desmatado em 2008 foi de 7000 km2, uma queda de 45%. O Eco convidou especialistas para analisar as razões por trás deste número. 

Redação ((o))eco ·
12 de novembro de 2009 · 15 anos atrás

O governo federal acaba de anunciar em Brasília em cerimônia com presidente Lula, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff e o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, o índice mais baixo de desmatamento desde que as medições começaram a ser feitas em 1988. De acordo com os números do Projeto de Monitoramento do Desflorestamento da Amazônia Legal (PRODES) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) o total desmatado no biênio 2008/2009, foi 7000 km2 ou 700 mil hectares. A taxa é 45% inferior ao registrado em 2007/2009 (12 mil km2).

O tamanho da área desflorestada não deve ser subestimada, pois ela é superior à extensão total do Distrito Federal, 5800 km2. Entre as tendências de desmatamento, o Pará e o Mato Grosso são os estados que lideram as derrubadas. Principalmente com o avanço da fronteira agropecuária pelo eixo da BR-163. Veja imagens de satélite de queimadas na BR 163

Tabelas e gráficos sobre desmatamento 2008/2009
Gráfico – Taxa de desmatamento anual da Amazônia
 
Tabela – Desmatamento por estado 2001-2009

Gráfico – Evolução do desmatamento por estado

O Eco convidou especialistas de organizações não-governamentais e institutos de pesquisa a analisarem as razões por trás desde número e quais os próximos passos na luta contra o desmatamento no Brasil. Continue ligado aqui em O Eco, novas análises serão publicadas a qualquer momento, assim como a cobertura completa do anúncio por Lula. 

Entrevista com Paulo Gustavo Prado, diretor de Política Ambiental da Conservação Internacional
Esta baixa dos índices se deve a uma combinação de causas onde, (i) a principal é a melhora na inteligência da fiscalização, se alia a esta causa as iniciativas do setor privado ligado ao consumo de produtos agrícolas que tem exigido e adotado medidas de exigência ambiental na compra deprodutos do agronegócio, assim como a continuada contribuição e participação da sociedade civil ( principalmente ONG´s) gerando transparência sobre as causas e efeitos dos desmatamento; sobre isto ainda se somam as atitudes de mudança no perfil de compra da iniciativa privada, pressionada pelo consumidores a responsabilizar-se pelas conseqüências ambientais das ações de seus fornecedores,como no caso da moratória da carne liderada pelo WalMart; (ii) Outra causa é avalorização cambial do Real frente ao Dólar que tem arrefecido a oferta do agronegócioafetando sua lucratividade e expansão territorial.

O que este anúncio representa para o Brasil em Copenhague?
Este anúncio em Copenhagen significa uma sinalização de que o Brasil pode controlar o desmatamento e portanto contribuir efetivamente para diminuir suas emissões. Significa também que o Brasil prefere neste momento adiar a expansão de seus comprometimentos com o clima, na medidaem que não alia a isto metas de controle de emissões industriais e de transporte que aprofundariam as mudanças para uma economia cada vez mais verde,com desculpa que precisa de recursos internacionais para acelerar esta agenda. O Brasil, ao levar somente uma agenda de controle de desmatamento, ainda não se reconhece como nação industrializada com relevância crescente, o que,certamente deverá atrasar nossa adequação, retardando oportunidades de nosefetivarmos como uma sociedade e uma economia de rápida adaptação de umaeconomia verde, o que nos vantagens competitivas únicas.

Estes baixos números significam uma nova tendência de uso da terra no bioma? Eles se manterão nos próximos anos e décadas?
Acredito que estes numerous indicam um maior comando e controle, mas não garantem sua manutenção uma vezque alternativas econômicas ao usos da terra ainda não estão delineadas para asáreas florestais. Inovações econômicas tem de se atrelar a estratégia decombate ao desmatamento de forma a garantir sustentabilidade social e econômicaàs populações da floresta. O que vai acontecer com a floresta e suas populações nos próximos anos e décadas , depende destas alternativas, de maior governança instalada e partilhada entre as esferas federais, estaduais e municipais, maior participação privada comprometida com linhas de inovação socioeconômica (e aí tem risco) e, de muita educação, capacitação e treinamento das sociedades locais para construir esta nova economia capaz de manter a floresta gerando renda equalidade de vida.

Paulo Mountinho, coordenador de pesquisas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia

A comemoração, contudo, deve ser comedida. Primeiro, porque, apesar das ações de governo, uma boa parte da queda nas taxas ainda pode ser explicada pela queda de preços das commodities e pela crise econômica mundial. Sem dinheiro, não se derruba floresta. Segundo, não há ainda por parte do governo como um todo, um compromisso claro com redução drástica e rápida, para não dizer extinção, do desmatamento. Apesar dos esforços do Ministério do Meio Ambiente e do Ministro Minc, há ainda um receio grande de que reduzir desmatamento significará menos desenvolvimento ou redução do PIB no futuro.

Parece que a cúpula do governo não entendeu que uma economia de baixo carbono está se instalando no mundo e que o Brasil tem tudo para fazer crescer ainda mais o PIB conservando suas florestas, intensificando a produção e gerando energia limpa. É só uma questão de tempo. Mas, como seguir numa trajetória de redução de desmatamento com ações do PAC que nada tem de ambiental? Como seguir com o claro apoio do governo à bancada ruralista do Congresso que quer o desmantelamento da legislação ambiental? O anúncio recente da intenção do governo em assumir uma meta (é isto mesmo, meta!) de redução de emissões nacionais pode ser a chance de o Presidente Lula consolidar de vez uma trajetória de extinção do desmatamento, não só na Amazônia, mas também no esquecido cerrado e outros biomas. Tomando esta decisão, Lula demonstrará um compromisso com o futuro e não somente com o processo eleitoral que se aproxima.

Philip Fearnside, pesquisador do INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia)

Seria uma responsabilidade maior, mas a vantagem para o Brasil seria grande. Se a emissão ficar abaixo da meta, a diferença poderia ser vendida, o que poderia representar uma boa receita. Também possibilitaria um fluxo bem maior de dinheiro do resto do mundo para ajudar o País em cumprir a meta, com vantagens para manter o ciclo hidrológico, a biodiversidade, e outros serviços ambientais da floresta.

Seria uma contribuição chave para conseguir um acordo global que, de fato, limitaria o aquecimento global a um nível que não colocasse em risco a floresta amazônica. Manter a floresta amazônica viva deve ser a primeira prioridade para o governo brasileiro, e isto necessita frear tanto as motosserras quanto as mudanças climáticas. É hora para o País assumir um compromisso contra ambos essas ameaças. Há muito mais informações sobre isso em: http://philip.inpa.gov.br.

Laurent Micol, pesquisador do Instituto Centro de Vida

Considerando o desempenho dos estados, qual podemos destacar?
A redução do desmatamento não está igualmente distribuída entre os estados. E podemos destacar Mato Grosso nesse contexto. O estado, que em 2003, por exemplo, contribuía com 40% do desmatamento total da Amazônia, em 2009 colaborou com 15%.

Isso é reflexo de uma situação de mais governança em Mato Grosso?
Sim. Além da intensificação da fiscalização, a governança também tem tido seu papel. O desmatamento está sendo cada vez menos aceito também pela sociedade local, e a pressão agora não vem apenas do órgão ambiental. Talvez ainda não dê para falar em mudança de consciência, mas está havendo uma percepção maior a respeito do que é desmatamento ilegal. Outro aspecto, que é um pouco subjetivo, é essa expectativa de compensação pela manutenção das áreas de floresta. Desmatar ou não é uma decisão de investimento, que está tendo um risco cada vez maior.

Os estados que têm uma meta de desmatamento vão conseguir cumpri-la se essa tendência continuar?
Nem todos os estados têm essas metas. Mas novamente podemos usar o exemplo de Mato Grosso, que tem uma meta de desmatamento de 4.400 km2 de 2006 a 2010. Já estamos abaixo dela. Para 2009, a meta assumida seria de 2 mil km2, e Mato Grosso desmatou praticamente a metade disso. A questão é, o que vai acontecer quando a situação econômica mudar? Fiscalização e esforço de governança têm que continuar firmes.

Quais são as maiores preocupações, diante de um quadro hoje tão positivo?
O desmatamento – corte raso – está caindo, mas a degradação florestal continua alta em Mato Grosso. Este ano tivemos bem menos queimadas, então não é o fogo que está provocando essa degradação. Há indícios de que está acontecendo muita extração florestal e manejo inadequados no estado. Com isso, as florestas em degradação ficam mais susceptíveis ao fogo ou são mais facilmente cortadas. Então existe uma situação atual de não estarmos talvez enxergando um desmatamento que vai acontecer pela frente.

Embora não haja ainda monitoramento anual do desmatamento no Cerrado, existe a possibilidade deste bioma se tornar um alvo ainda maior com as restrições para atividades destrutivas na Amazônia?
Esse risco é muito real. Vivemos uma tendência de aumento de áreas para agricultura e as restrições na Amazônia estão cada vez maiores. O INPE tem planos de monitorar também o Cerrado, e isso é fundamental, pois se o desmatamento ali estiver aumentando, corremos o risco de chegar a um saldo zero de redução do desmatamento no país (uma vez que na Amazônia ele reduz, mas no Cerrado ele cresce). O Cerrado tem várias tipologias de vegetação, algumas muito densas. As emissões são muito significativas.

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