A solução encontrada para salvar o bicudinho-do-brejo-paulista gerou um projeto inédito no Brasil: transportar as aves das áreas ameaçadas para brejos do entorno, considerados locais apropriados e com menos riscos. Ou, no jargão científico, translocá-las. Com o apoio do Ibama, do Departamento de Águas e Energia Elétrica (Daee) e da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sema), os trabalhos começaram imediatamente, em março.
“Não sabíamos quais seriam os resultados, nem mesmo se as aves se adaptariam àqueles locais. Havia dois caminhos: a morte de 100% dos animais ou de 100% menos x”, diz o biólogo. Seis meses depois, a dúvida transformou-se em boa notícia: 52 dos 72 pássaros salvos foram reavistados no novo ambiente.
O trabalho de resgate e soltura dos animais foi feito em três expedições ao longo de dois meses, por veterinários, alunos e estagiários da USP. Diariamente, eles saíam às matas e brejos da região em busca de mais exemplares dos moradores até então desconhecidos, com o cuidado de não machucá-los na captura. A fim de identificar os bicudinhos, os pesquisadores coletaram dados como peso, tamanho, asa, cauda, bico e parasitas, e anilharam cada um deles. Também foram retiradas amostras de sangue das aves, para a realização de estudos genéticos.
Casa nova
Ainda se sabe muito pouco sobre a propagação dos bicudinhos. “O período de reprodução de grande parte dos animais, inclusive das aves, começou na primavera. Só agora poderemos notar como se relacionam. Pelo que percebemos até o momento, parecem ser monogâmicos”, diz Silveira.
Para dar continuidade ao projeto de monitoramento e descoberta de novos pássaros do gênero, a bióloga Érika Machado Costa Lima permanece, durante 15 dias de cada mês, alojada nos arredores de Salesópolis. Diariamente, observa as 12 regiões em que as aves anilhadas foram soltas e registra a evolução do trabalho numa planilha padronizada. “Faço o play-back (ligar um gravador com o canto do pássaro para atrair outros da mesma espécie) na região e, depois de um ou dois minutos, eles chegam”, conta. “Para mim, é muito gratificante ver um animal que soltei há seis meses retornar. Sinal de que a técnica é válida”.
O bicudinho-do-brejo-paulista é do gênero Stymphalornis, descoberto em 1995. Ainda não tem nome científico definido. Para que seja batizado oficialmente, é necessária a publicação de um artigo científico que descreva as principais características morfológicas da ave. A descoberta será formalizada por Luís Fábio Silveira, pelo ornitólogo Dante Buzzeti - que já havia avistado a espécie no final do ano passado – e pelos pesquisadores Marcos Borschein e Bianca Reinert. “Encontrar uma nova espécie é sempre importante. Mas quando é avistada no local que foi, perto da maior cidade do país, é uma felicidade ainda maior”, diz Silveira.
Leia também
COP3 de Escazú: Tratado socioambiental da América Latina é obra em construção
No aniversário de três anos do Acordo de Escazú, especialistas analisam status de sua implementação e desafios para proteger ativistas do meio ambiente →
Querem barrar as águas do ameaçado pato-mergulhão
Hidrelétricas são planejadas para principais rios onde vive o animal sob alto risco de extinção, na Chapada dos Veadeiros →
Livro destaca iniciativas socioambientais na Mata Atlântica de São Paulo
A publicação traz resultados do Projeto Conexão Mata Atlântica em São Paulo, voltados para compatibilização de práticas agropecuárias com a conservação da natureza →