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Código Florestal ameaça Política Nacional sobre Mudança do Clima

O texto do deputado Aldo Rebelo contraria artigos da Lei 12.187/09 que prevê redução de emissões de gases-estufa e preservação das florestas.

Flávia Moraes ·
27 de maio de 2011 · 14 anos atrás

 

Desmatamento é a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa no Brasil. A política  nacional do clima estabeleceu meta de reduzir em 80% as derrubadas na Amazônia até 2020. foto: INPE/Fototeca
Desmatamento é a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa no Brasil. A política nacional do clima estabeleceu meta de reduzir em 80% as derrubadas na Amazônia até 2020. foto: INPE/Fototeca
O texto-base das alterações do Código Florestal (Lei 4771/65) aprovado na Câmara dos Deputados na última terça (24) enfraquece a legislação da Política Nacional de Mudança do Clima (PNMC). Isso porque, num mundo de alterações climáticas, manter as florestas preservadas é essencial para reduzir os impactos sociais futuros do aquecimento global. Essa é uma das constatações que o diretor executivo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Paulo Moutinho, apresenta sobre os impactos que o novo Código deve causar sobre as intenções da PNMC.

O abalo na Política Nacional de Mudanças do Clima, com a aprovação do texto do deputado Aldo Rebelo, deve-se ao fato de que a PNMC destaca, em alguns de seus artigos, a importância de se privilegiar o desenvolvimento sustentável e de se reduzir atividades antrópicas que promovam emissões de gases de efeito estufa (GEE). Esses aspectos batem de frente com a permissividade ao desmatamento proposto pelo novo Código, já que as queimadas são consideradas as grandes vilãs da emissão de GEE no Brasil. (ver quadro de incoerências abaixo)

Moutinho também destaca a imagem equivocada que a Câmara está passando para a sociedade brasileira e para o mundo. “A anistia aos desmatadores ilegais, mostra impunidade e falta de governança futura sobre o desmatamento. Ao aprovar esse texto você diz ao país e ao mundo que as intenções do Brasil em reduzir o desmatamento e as emissões são mutáveis, não são sérias, passando uma mensagem contrária ao que o país emite interna e externamente”, justifica. Além disso, acrescenta o diretor executivo do IPAM, o Código contraria a PNMC, a qual tenta criar um novo uso de manejo e conservação ambiental, inclusive com mecanismos econômicos para manter a floresta em pé.

Compromissos internacionais

Rafael Cruz, coordenador para Código Florestal do Greenpeace, ressalta que de fato o deputado Aldo Rebelo não levou em consideração a posição internacional que o Brasil assumiu nas últimas Convenções do Clima da ONU. “Este mundo que o deputado criou, e os ruralistas se sentiram a vontade de habitar, não considera todos os trabalhos de pesquisa na área de clima e desmatamento nem o discurso do ex-presidente Lula e da então ministra Dilma em Copenhagen (COP15). É como se ele tivesse jogado tudo isso no lixo”, critica.

Para o Coordenador do Programa Mudanças Climáticas e Energia do WWF-Brasil, Carlos Rittl, a aprovação do texto coloca à prova tudo o que foi feito até o momento. “Se o Código fosse sancionado na terça-feira, junto com a emenda 164, estaria ameaçando a Política Nacional sobre Mudança do Clima, pelo estímulo a novos desmatamentos e a anistia aos desmatadores. Assim, esse texto desastroso desafia a nossa capacidade de atingir os objetivos propostos em leis [nas metas da PNMC] e as propostas internacionais feitas pela presidente Dilma”, explica.

Os três entrevistados foram unânimes em exemplificar as dificuldades que o Código Florestal impõe às metas de redução de gases-estufa e preservação das áreas de sumidouros naturais desses gases, apontando o que ocorreu no Mato Grosso. Só a expectativa da aprovação do texto na Câmara já resultou na explosão do desmatamento nesse Estado, entre os meses de março e abril (que costumam ter os menores índices devido às chuvas). Os prejuízos ambientais chegaram a 477,4 Km², o equivalente a 58 campos de futebol do tamanho do Maracanã.

“O que está em discussão é uma falsa disputa entre agricultura e meio ambiente, só que isso não existe. A agricultura depende do meio ambiente, do solo conservado, da água, das chuvas regulares, depende da conservação. A sustentabilidade do fator agrícola é indispensável para a inserção dos nossos produtos no mercado internacional. Mas com essa visão de que o desenvolvimento econômico precisa sacrificar o meio ambiente todos saem perdendo: as florestas, a biodiversidade, os solos, o clima regional, o clima do planeta e, inclusive, a nossa economia”, conclui Rittl.

Principais incoerências entre o Código Florestal e a Política Nacional sobre Mudança do Clima
PNMC Código Florestal
Artigo 2°
Prevê a implementação de medidas que reduzam as emissões de gases de efeito estufa e aumentem os sumidouros.
Áreas consolidadas
Dispensa propriedades de até quatro módulos fiscais da necessidade de recompor as áreas de Reserva Legal utilizadas;

Quem desmatou antes do aumento dos percentuais de RL (a partir de 2000) deverá manter a área exigida pela legislação da época.

Punição (ou anistia)
Isenta os proprietários rurais das multas e demais sanções previstas na lei em vigor por utilização irregular, até 22 de julho de 2008, em áreas protegidas;

Para ter o perdão das dívidas, o produtor deverá assinar o termo de conduta para regularização das áreas de proteção;

Para os agricultores que se inscreverem no Cadastro Ambiental serão suspensas as sanções administrativas, inclusive as relativas ao Decreto n° 7029/09, que prevê penalidades para quem não tiver Reserva Legal averbada até 11 de junho deste ano.

Artigo 3°
O desenvolvimento sustentável é a condição para enfrentar as alterações climáticas e conciliar o atendimento às necessidades comuns e particulares das populações e comunidades que vivem no território nacional.
Artigo 4°
Visa à preservação, à conservação e à recuperação dos recursos ambientais, com particular atenção aos grandes biomas naturais tidos como Patrimônio Nacional;

Também visa à consolidação e à expansão das áreas legalmente protegidas e ao incentivo aos reflorestamentos e à recomposição da cobertura vegetal em áreas degradadas.

Artigo 6º
São instrumentos da Política Nacional sobre Mudança do Clima: os Planos de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento nos biomas.
Itens da emenda 164
Permite a intervenção ou supressão de vegetação em APPs e a manutenção de atividades consolidadas até 22 de julho de 2008, nas hipóteses de utilidade pública, interesse social ou de baixo impacto ambiental, previstas na Lei, bem como atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural;

Outras atividades em APPs poderão ser permitidas pelos estados por meio de Programas de Regularização Ambiental (PRA) se não estiverem em áreas de risco.

Leia também:

Íntegra o texto da Lei 12.187/09 (PNMC)
Texto do novo Código Florestal
Dispara o desmatamento no Mato Grosso em abril por Nathália Clark
MMA atualiza lista de desmatadores da Amazônia por Karina Miotto

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  • Flávia Moraes

    Jornalista, geógrafa e pesquisadora especializada em climatologia.

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